Os tibetanos, aproveitando o clima de euforia com a tocha olímpica, conseguiram expor para o mundo a opressão do regime chinês. Ingrid Betancourt, libertada de um cativeiro numa operação militar ainda não totalmente explicada, mostrou ao mundo o intrincado jogo geopolítico da América Latina -- França, Estado Unidos e Colômbia participaram, de alguma forma, no resgate.Eventos impressionantes começaram a se suceder numa cascata surpreendente lá pelo meio do ano. Barack Obama reuniu mais de duzentas mil pessoas em Berlim em um comício -- para quê, se os alemães não votam em presidentes americanos? Ainda no início do primeiro semestre, duas instituições financeiras gigantes pediram falência. A bolha especulativa das hipotecas, do crédito fácil e das bolsas pipocou. Veio a avalancha. Trilhões de dólares viraram fumaça. E o mundo, estarrecido, passou a contemplar a possibilidade de uma depressão, tão severa quanto a de 1929.
Em 2008, meninos e meninas também viraram notícia pelos maus-tratos que sofreram. Alguém jogou Isabella por uma janela. Igor e João Victor, mortos pelo pai e pela madrasta, nos entristeceram. A polícia soltou crianças que estavam algemadas e amarradas pelos pés. A nação ainda não despertou para a crua realidade de que o Brasil cuida mal dos
E agora, o que virá pela frente? Sabemos que, em alguns aspectos, o mundo nunca mais será o mesmo. O racismo dos Estados Unidos, com certeza, perderá sua força. O cartel do tráfico colombiano tende a enfraquecer. O projeto econômico neoliberal vai terá de ser revisto; a aposta de que o mercado ajusta o próprio mercado mostrou-se perigosa.
As preocupações mundiais continuarão contraditórias. O Haiti, assolado por furacões, continuará se debatendo na miséria a poucos quilômetros do país mais rico do planeta. Como a Unesco tem poucos recursos para salvar vidas inocentes e sobra dinheiro para acudir as instituições bancárias? Infelizmente, enquanto os estoques de petróleo continuarem abundantes, suprindo a demanda mundial, não haverá interesse em desenvolver tecnologia que diminua a emissão de gás carbono.A história do violinista Ytzahak Perlman é comovente e serve de inspiração nestes tempos delicados. Perlman contraiu pólio aos 4 anos de idade e desde então caminha com muletas. Apesar desse impedimento, tornou-se um grande violinista, um “virtuose”. Diz-se que, certa vez, no palco, sentou-se, colocou as muletas ao lado e posicionou o violino sob o queixo para começar a afiná-lo. De repente, com um ruído estridente, uma das cordas se rompeu. Quando todos esperavam que ele pedisse outra corda, ele fez um sinal ao maestro para começar e executou todo o concerto com apenas três cordas. No final, todos o ovacionaram em pé. Quando lhe deram a palavra, disse: “Nossa tarefa é fazer música com o que resta”. Claro, todos entenderam que as suas palavras se referiam à vida, e não a cordas arrebentadas apenas.
Em 2009, a história continuará ambígua. Dores se misturarão à felicidade. Experimentaremos perplexidade e esperança, luto e festa, descaso e solidariedade, insultos e marchas pela paz; rindo ou chorando, precisaremos aprender a fazer música com as cordas que nos restarem.
Texto de Ricardo Gondim.
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